Neste domingo, 08, comemora-se o Dia Internacional da Mulher. Como sempre ocorre em situações onde o calendário dita comportamentos, não faltarão análises sociológicas e homenagens de toda espécie. Para não perder o foco, a reportagem de A Cidade selecionou três personagens do universo feminino local para contextualizar a discussão em torno do papel da mulher na sociedade. Maria de Jesus Souza Romão, mãe de seis filhos, que recolhe material reciclado nas ruas para ajudar na renda doméstica; Heloide Bernadete Camargo Marques, professora, viúva, mãe de cinco filhos, e Camila Brianti, 18 anos, que representa uma geração mais focada no sucesso profissional do que em constituir família muito cedo. Três relatos que desmontam aquela caracterização que por muito tempo vinculou o públicofeminino a uma conotação de dependência social.
Heloide defende equilíbrio na relação trabalho e família
A professora Heloide Bernadete Camargo Marques disse que os muitos anos conciliando o trabalho como educadora e o de mãe de cinco filhos (Érica, Willian, Ronaldo Junior, Milena e Ingrid) lhe propiciou chegar a uma etapa da vida onde aprendeu também a enxergar a importância de se cuidar bem igualmente do engrandecimento espiritual. Pessoa extremamente religiosa, ela reza o terço regularmente em residências da Vila Ilze em companhia da irmã Silvana e elegeu como espécie de atribuição pessoal visitar doentes em hospitais. “Você não tem ideia de como esta atividade permite que você engrandeça interiormente. Você leva carinho, afeto e recebe, em contrapartida, lições e ensinamentos como a paciência, a caridade e não raramenteda mais pura sabedoria no relato destas pessoas”, afirmou. “Não é só a saúde física que importa, você tem que se preocupar com a saúde mental e espiritual”.
Ela fala com saudade e emoção do saudoso marido, o ex-servidor da Câmara Municipal de Itapira, José Ronaldo Marques, dizendoque não existe sentimento de modernidade que supra a relação entre marido e esposa dentro do contexto familiar. “Como sempre dei aula na zona rural, ele chegou ao ponto de levar filho para que eu o amamentasse” ilustrou. Para as mais jovens, deixa uma lição: “mãe que se preza tem que pelo menos dedicar meio período do dia aos filhos”.
Ela diz que não é do tipo implicante quando se toca na questão da modernidade e de que os tempos são outros, mas acha que a sociedade atual está repleta de vícios que comprometem a formação da cidadania. “Hoje as pessoas se deixam conduzir pela necessidade de um consumismo desenfreado. Eu criei meus filhos mostrando a eles o que podíamos possuir e o que não poderíamos. Nem por isso eu e meu marido os privamos daquilo que era fundamental. Hoje em dia eu me assusto ao ver uma criança entocada dentro de casa na frente de um computador, de uma Televisão. Crianças tem que brincar na terra”, defendeu.
Camila diz que é importante ir à luta
Camila Brianti é uma das profissionais que atendem na Farmácia Glicério, onde trabalha há pelo menos três anos. Egressa do Jovem em Ação, onde ingressou com 15 anos, ela disse que a iniciativa de trabalhar desde cedo foi dela própria, embora com consentimento e apoio dos pais Paulo e Ivonete, moradores no bairro do Cubatão. “Sempre tive desde muito cedo um sentimento de independência, de correr atrás das minhaspróprias coisas, da realização dos meus sonhos”, contou.
Aos 18 anos diz que pretende retomar os estudos - concluiu o Ensino Médio - tão logo receba uma certificação profissional do SENAC, onde se matriculou num curso que ensina técnicas de atendimento em farmácias. Ela afirma que a prioridade do momento é se estabelecer profissionalmente e a questão de constituir família é algo que segundo ela passa distante de seu radar. “Não é algo que esteja entre minhas prioridades de momento. Quero estudar, me capacitar e trabalhar. Gosto demais do meu trabalho. Um dia, talvez, as prioridades mudem, mas neste momento de minha vida estou focada na minha carreira profissional”, reforçou.
Camila conta ainda que esta sua visão das coisas é compartilhada pela maioria das colegas de sua geração. “A maioria das minhas amigas pensa como eu. Querem se realizar profissionalmente, antes de pensar em constituir família. Acho que tem tempo para tudo e cabe a cada umdecidir o que priorizar na vida”. O pensamento de Camila corrobora, por exemplo, colm a procurapor uma vaga dentro do Jovem em Ação , onde começou sua preparação para a atividade profissional. A psicóloga Eliseia Stringuetti conta que a cada novo processo de acolhimento, cresce o número de meninas. “Hoje elas seguramente já superam os meninos em termos de matrículas”, opinou.
Dona Maria Romão se acostumou com as dificuldades do dia a dia
Com 50 anos de idade, a dona de casa Maria de Souza Jesus Romão contou que recolhe material reciclado há pelo menos 22. Natural de Santo Antonio daPosse, veio ainda bastante jovem para Itapira. A rotina sempre foi de muito trabalho. Quando se casou com Benedito Romão, que está desempregado, segundo afirmou, ajudava o marido na lida com a manutenção de sítios e chácaras onde ele trabalhou como caseiro e jardineiro. Tem quatro filhos e vive com a mais velha, Cristiane, numa casa do bairro Flávio Zacchi.
Dona Maria disse que sua rotina fora de casa dura aproximadamente seis horas. Queixa-se de que o preço do material caiu muito e que às vezes fica imaginando se vale apena o sacrifício. “Às vezes eu saio para catar material até aos sábados. Fico pensando se paro ou não, mas ainda que pouco, o dinheiro faz falta”, reconhece. Ela disse que faz muito tempo que não tem registro na carteira de trabalho.
Apesar de todas as dificuldades, ela se diz satisfeita por ter saúde. Não se ilude facilmente com os ecos da modernidade e torce para que os filhos consigam levar uma vida melhor. “A gente sempre faz tudo pelos filhos. O pouco queganhei vendendo material reciclado empreguei tudinho para tentar melhorar a situação de todos nós. Eu e o pai deles sempre deixamos claro que a vida é cheia de obstáculos, mas que a gente deve lutar com as armas que possuímos para que as coisas melhorem, sem abrir mão honestidade e da fé em Deus”, receitou.