Para comemorar os cinco anos da Lei Maria da Penha (medida contra a violência doméstica e familiar contra a mulher), a Defensoria Pública do Estado de São Paulo lançou uma cartilha para esclarecer dúvidas sobre a proteção oferecida pela lei às mulheres vítimas de violência.
"A Defensoria Pública possui um Núcleo Especializado de Promoção e Defesa da Mulher que conta com 15 defensores (homens e mulheres). Discutimos todos os temas referentes ao universo feminino. Descobrimos que as mulheres não sabem como funciona a lei ou como agir para denunciar seus agressores", explica a defensora pública Ana Paula de Oliveira Meireles.
A Pesquisa do Instituto Avon/Ipsos,
Percepções sobre a violência doméstica contra a mulher no Brasil (2011), realizada com 1,8 mil pessoas em cinco regiões, revela que 94% dos entrevistados conhecem a Lei Maria da Penha, mas apenas 13% sabem o seu conteúdo. "Daí a importância da cartilha que contém informações sobre os locais de atendimento e explicações sobre os direitos e como funciona a legislação".
Inicialmente, foram impressas 50 mil unidades da publicação, que também está disponível na íntegra no
siteda Defensoria (
www.defensoria.sp.gov.br). O exemplar também traz uma lista de entidades que atendem as mulheres vítimas da violência.
Na mesma pesquisa do Instituto Avon foi revelado que seis em cada dez brasileiros conhecem alguma mulher agredida. Desse total, 63% tomaram alguma atitude, o que demonstra a mobilização de grande parte da sociedade para enfrentar o problema. Vinte e sete por cento das mulheres entrevistadas declararam já ter sido vítimas de violência doméstica - apenas 15% dos homens admitiram ter praticado esse crime.
De acordo com Rosmary Corrêa, a delegada Rose, presidente do Conselho da Condição Feminina, a cartilha é apenas uma das ferramentas para combater a violência presente ainda nos lares brasileiros. Apesar de a lei ser uma das melhores do mundo, ainda há dificuldade na sua efetiva implantação. "Defendemos a melhora na capacitação e na sensibilização do atendimento de ponta (delegacias de polícia)". Hoje, existem 129 delegacias da mulher em todo o Estado de São Paulo. Temos de capacitar o profissional que faz o atendimento de ponta (delegado, investigador e o policial militar que dá atendimento no local). A mulher só tem acesso à rede se conseguir passar por essa porta de entrada.
Apesar de a lei estar comemorando cinco anos, a psicanalista Tatiana Ades afirma que "hoje ainda assistimos a centenas de mulheres sendo mortas ou espancadas todos os dias. Há a necessidade de falar disso cada vez mais, sempre para tentarmos alertar dos perigos. Um tapa pode significar a morte de uma mulher", avisa.
Dados da Secretaria Estadual da Justiça e da Defesa da Cidadania revelam que 262.507 casos de violência doméstica foram registrados nas delegacias do Estado desde 2009. Na capital, foram 50.873. Desde a sua instalação, o Juizado de Violência Doméstica da Barra Funda recebeu 5.722 ocorrências, incluindo inquéritos policiais, processos e medidas cautelares, como a que determina que o agressor mantenha uma distância mínima da vítima. Outros 5.126 casos estavam em andamento até o mês de maio em fóruns regionais das zonas sul, leste, norte e oeste da cidade. Os indicadores da Secretaria da Segurança Pública revelam que somente no primeiro semestre de 2011 houve 52.762 vítimas.
"Infelizmente descobrimos que a cada 15 segundos uma mulher é vítima de violência doméstica no Brasil. Os números são altos e estão aí para comprovar", afirma Ana Paula. De acordo com a delegada Rose, o Brasil ocupa a 10ª posição no
rankingde violência contra as mulheres. "É um nível preocupante e os casos continuam sendo mostrados todos os dias nos noticiários".
Dados da OMS revelam que quase metade das mulheres assassinadas são vítimas do marido ou do namorado (atual ou ex). A violência responde por aproximadamente 7% de todas as mortes de mulheres entre 15 e 44 anos no mundo. Em alguns países, até 69% das mulheres relatam terem sido agredidas fisicamente e até 47% declaram que sua primeira relação sexual foi forçada.
Ao entrar na 5ª Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), na Vila Zilda, zona leste, a mulher vítima da violência doméstica depara-se com um espelho. "O objetivo é que ela olhe para aquele objeto e veja uma mulher inteira e digna de respeito", diz Maria Helena do Nascimento, delegada titular da 5ª DDM.
De volta há seis meses para a delegacia da mulher, onde atuou durante cinco anos, Maria Helena faz um balanço da Lei Maria da Penha: "Houve avanços, mas as mulheres precisam conhecer melhor a legislação que dá medidas protetivas a ela e aos filhos". Hoje, São Paulo conta com 123 delegacias em todo o Estado. Somente na capital paulista são nove.
Para ajudar a romper o silêncio, a delegacia dispõe de psicólogas, duas escrivãs na recepção, quatro escrivãs de cartórios, uma escrivã chefe e seis investigadores (três homens e três mulheres). "Mais do que corpos machucados, as mulheres que chegam aqui estão com sua autoestima despedaçada, além dos bens materiais destruídos". Maria Helena ressalta que os homens agressores quebram celulares,
notebooks, carros, casa, mobília. "Tudo que dará prejuízo para a mulher".
Para as crianças que acompanham as mães, a delegacia oferece uma brinquedoteca. "Ali elas são ouvidas em um ambiente diferente das delegacias comuns. É o mundo delas, onde conseguem falar sobre a violência pela qual passaram".
Ao entrar na sala da delegada titular, as mulheres deparam com um ambiente cor-de-rosa (até o carimbo de Maria Helena é dessa cor), acolhedor, bem diferente daquele que essa mulher está acostumada a ver.
A Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (Lei Maria da Penha) foi sancionada no dia 7 de agosto de 2006 pelo então presidente da República Luís Inácio Lula da Silva. A história de Maria de Penha marcou o País e deu nome e mote à medida que protege as mulheres que sofrem de violência doméstica.
No Brasil existem 70 juizados de violência doméstica. Além disso, 388 delegacias especializadas no atendimento à mulher, 193 centros de referência para tratamento das vítimas e 71 casas, nas quais essas mulheres podem ser abrigadas temporariamente. A mulher que sofre uma violência doméstica pode recorrer à Central de Atendimento à Mulher por meio do telefone 180. O serviço da Secretaria de Políticas para as Mulheres registrou 734.416 atendimentos em 2010, dos quais 108.026 foram relatos de violência física, psicológica, moral ou sexual. Também foram notificadas 58.714 ocorrências de lesão corporal e 15.324 de ameaças, que correspondem a 55% e 14,4% do total de relatos de violência, respectivamente.
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