Um ‘dia’ na eternidade pretérita, reunida em sacratíssimo Conselho, a Trindade por iniciativa do Pai estabeleceu um plano de redenção para a humanidade que haveria de pecar. Nesse ‘dia’ na eternidade, o Filho foi designado pelo Pai e aceitou voluntariamente em amor, nos termos em que fala o apóstolo Paulo: “que, embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se; mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens. E, sendo encontrado em forma humana, humilhou-se a si mesmo e foi obediente até à morte, e morte de cruz!” (Filipenses 2.6-8). Assim, o Filho quis vir ao mundo, tendo recebido do Pai uma lista de homens e mulheres escolhidos, nos termos do mesmo apóstolo Paulo: “Porque Deus nos escolheu nele antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis em sua presença. Em amor nos predestinou para sermos adotados como filhos por meio de Jesus Cristo, conforme o bom propósito da sua vontade, para o louvor da sua gloriosa graça, a qual nos deu gratuitamente no Amado” (Efésios 1.4-6), para resgatá-los de suas dívidas e pecados e dar-lhes um lugar no céu. Tudo isso ocorreu na eternidade. No tempo previamente determinado pelo Pai, transcorridos muitos séculos desde a criação do mundo e a Queda de nossos primeiros pais, por amor Deus envia o seu amado Filho: “Porque Deus tanto amou o mundo que deu o seu Filho Unigênito, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna. Pois Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para condenar o mundo, mas para que este fosse salvo por meio dele” (João 3.16,17). É esse admirável intercâmbio de dons entre o céu e a terra que celebramos no Natal. Deus em Cristo assume a nossa natureza miserável e nos dá gratuitamente a sua riqueza, glória e imortalidade. Concede-nos a sua graça enquanto carrega sobre si os nossos pecados. Por essa primeira vinda somos gratos no Natal. Por esses dons e por essas dádivas do amor do Pai somos gratos quando comemoramos na liturgia e em família a essência do Natal que é o amor do Pai ao dar-nos a vida em seu Filho de presente a nós que não a merecíamos. Por isso observamos o tempo do Advento para que os nossos corações e os nossos sentimentos não nos desviem para as coisas secundárias e alienígenas das festas natalinas. Para que nós mesmos não valorizemos o superficial e o transitório, a ponto de perder de vista o que é essencial e eterno, o fato de que em Jesus, na sua vinda, os pecadores são perdoados de seus pecados e reconciliados com o Pai. Preocupados com a ceia, com os presentes, com os cartões, com os enfeites, podemos facilmente nos esquecer de preparar os nossos corações para a vinda intermediária de Jesus. Ele veio uma primeira vez nascido de Maria na gruta de Belém. Ele há de voltar uma segunda vez em grande glória sobre as nuvens para consumar a obra da redenção. Entre uma e outra Ele vem a nós em sua Palavra, no Sacramento, quando nos reunimos em seu Nome e por amor a Ele no ajuntamento solene: “Pois onde se reunirem dois ou três em meu nome, ali eu estou no meio deles" (Mateus 18.20); Ele vem a nós quando praticamos boas obras, obras de misericórdia e amor: “Venham, benditos de meu Pai! Recebam como herança o Reino que lhes foi preparado desde a criação do mundo. Pois eu tive fome, e vocês me deram de comer; tive sede, e vocês me deram de beber; fui estrangeiro, e vocês me acolheram; necessitei de roupas, e vocês me vestiram; estive enfermo, e vocês cuidaram de mim; estive preso, e vocês me visitaram. Então os justos lhe responderão: Senhor, quando te vimos com fome e te demos de comer, ou com sede e te demos de beber? Quando te vimos como estrangeiro e te acolhemos, ou necessitado de roupas e te vestimos? Quando te vimos enfermo ou preso e fomos te visitar? O Rei responderá: Digo-lhes a verdade: o que vocês fizeram a algum dos meus menores irmãos, a mim o fizeram” (Mateus 25.34-41). Tão importante quanto celebrar a primeira vinda e aguardar a segunda, é estar preparados para não negligenciar esta vinda intermediária de Jesus que vem a nós a todo instante, em qualquer momento, sempre que desejamos e sempre que o acolhemos. Para quem Jesus não é uma presença e uma chegada diárias, uma festa num único dia no ano, não diz muito, se é que diz alguma coisa. Sem receber a Jesus todos os dias em sua Palavra e sem acolhê-lo nas obras de misericórdia, esperar por Ele em sua volta definitiva não faz nenhum sentido. Não se arruma a casa para receber quem não se está esperando ou quem nem se conhece. Que o Advento nos ajude a celebrar a primeira vinda e por ela darmos graças a Deus. Que o Advento nos dê a consciência de que o Rei em breve virá nos buscar. E que entre uma e outra, acolhamos a Jesus e com Ele nos encontremos em nosso viver centrado na Palavra e em um viver santo.
Rev. Luiz Fernando é Ministro da Palavra na Igreja Presbiteriana Central de Itapira, Coordenador do departamento de Teologia Pastoral e professor no Seminário Presbiteriano do Sul; Professor no Seminário Teológico Servo de Cristo SP; Professor no Programa de Pós-graduação da Faculdade Teológica Batista; Presidente do Presbitério de Campinas.
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