Desde que fomos expulsos do paraíso, ansiamos por voltar para um lugar de paz perfeita, alegria plena e indestrutível, prazer perene, comunhão verdadeira com as pessoas e claro, santa comunhão com Deus numa relação harmoniosa. Logo, cabe-nos perguntar se o paraíso é somente saudade ou é também esperança. A fé cristã ensina as duas coisas. Saudades dos tempos paradisíacos antes da Queda e esperança pela restauração de todas as coisas em Cristo, nos novos céus e nova terra. O Advento então, é uma proclamação desta esperança, é uma força a arrastar-nos para o futuro que certamente chegará. Como eu escrevi em nossa última pastoral, é uma prática individual e comunitária da espera pela volta gloriosa de Jesus. O advento é um tempo em que devemos aprofundar a nossa vocação escatológica, de viver com mais verdade a nossa realidade transcendental. Este tempo litúrgico nos convida a erguer a vista sobre a realidade do tempo presente, marcado pela transitoriedade e caducidade de todas as coisas. Este nosso tempo que traz consigo as marcas e os efeitos destrutivos e deterioradores do pecado, uma experiência marcada pela dor, o sofrimento, a imperfeição e a morte. Estas marcas são experimentadas de muitas e variadas maneiras. Estão presentes e patentes na corrupção política, na violência doméstica, na brutal violência do trânsito, na escalada sempre crescente de crimes contra a vida, na conformada convivência com a pedofilia, na infame “cultura do estupro”, na indústria e turismo do sexo, na exploração da fé por falsos pastores e etc. Mas, nenhuma dessas coisas citadas nos derrotam tanto quanto a nossa pessoal experiência de nossa pecaminosidade latente e às vezes dominante, como esta relatada pelo apóstolo Paulo: “Não entendo o que faço. Pois não faço o que desejo, mas o que odeio. E, se faço o que não desejo, admito que a lei é boa. Neste caso, não sou mais eu quem o faz, mas o pecado que habita em mim. Sei que nada de bom habita em mim, isto é, em minha carne. Porque tenho o desejo de fazer o que é bom, mas não consigo realizá-lo. Pois o que faço não é o bem que desejo, mas o mal que não quero fazer, esse eu continuo fazendo. Ora, se faço o que não quero, já não sou eu quem o faz, mas o pecado que habita em mim. Assim, encontro esta lei que atua em mim: Quando quero fazer o bem, o mal está junto a mim. Pois, no íntimo do meu ser tenho prazer na lei de Deus; mas vejo outra lei atuando nos membros do meu corpo, guerreando contra a lei da minha mente, tornando-me prisioneiro da lei do pecado que atua em meus membros” (Rm 7.15-23). Como disse, nenhuma experiência é tão dolorosa e causa tanto abatimento como essa descrita por Paulo. Esta é a nossa verdade também. O Advento é um tempo de alento que usa justamente o restante da passagem citada para nos impulsionar sobre o por vir, para nos animar a continuar atravessando em meio a este vale de lágrimas, para a entrada definitiva no Reino de vida e justiça para todos: “Miserável homem eu que sou! Quem me libertará do corpo sujeito a esta morte? Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor” (Rm 7.24,25). E por que precisamos de um tempo assim? Exatamente porque a nossa natureza rapidamente se acomoda, porque nosso coração se deixa enredar, seduzir e no final se aprisionar pela realidade desta vida. Embora o pecado seja essencialmente mal, nem sempre ele se revela feio e não palatável. Eva, pouco antes de pecar, atestou ser o pecado algo bom de se olhar e mesmo desejável de se experimentar. Assim, precisamos de a todo tempo e de tempos em tempos, receber uma “dose extra” de esperança e um choque de escatologia. Precisamos ser recordados de que esta vida não é tudo o que há e que estamos destinados, por graça e misericórdia, a desfrutar de um mundo infinitamente melhor, incomparavelmente perfeito, santo, justo, harmonioso, feliz e etc. Devemos ser alertados que o modo como gerenciamos os bens deste mundo, como os empregamos, como os gastamos e a finalidade última que lhes destinamos, indicam exatamente onde temos colocado a nossa expectação e qual o ‘tamanho’ do futuro que aguardamos. O Senhor Jesus veio uma vez, visitou-nos em nossa carne, fez-se um de nós e enquanto viveu a nossa realidade, ensinou-nos a anelar por aquela vida que Ele conhecia desde sempre nas moradas celestes. Depois de ter cumprido na cruz a sua missão e tendo voltado para os céus, foi-nos preparar um lugar. É este o lugar, no futuro, para onde tendemos e para onde desde agora, devemos ansiar. Advento, voltando para a casa!
Reverendo Luiz Fernando é ministro do Evangelho na Igreja Presbiteriana Central de Itapira
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