Para além do fato evidente de que se trata de uma solenidade confessional, isto é, “todo espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne procede de Deus” (1 Jo 4.2), é inegável que existam preciosas lições secundárias, porém, tão necessárias à vida de todo homem, lições que tornam a nossa existência com um propósito menos autocentrado e a nossa convivência com os demais homens e mulheres mais pacífico e feliz. O Natal nos recorda a compaixão e a empatia de Deus pelos pecadores, como ensina um autor do Novo Testamento: “pois não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas, mas sim alguém que, como nós, passou por todo tipo de tentação, porém, sem pecado” (Hb 4.15; 5.12). O pai enviou o Filho não como um super-herói, não como um mero expectador distante dos dramas e dilemas humanos, alguém de tão superior, insensível. Na verdade, a ‘encarnação’ revela a profunda empatia de Deus com a nossa desventura. Ele entrou em cheio em nossa vida e em nossa história. Viveu todas as nossas vicissitudes, exceto o pecado. Sentiu sede, fome, cansaço, tristeza, medo, dor, angústia, abandono e, enfim, a morte. Foi duramente tentado por Satanás, sem ceder à tentação, recebeu a dolorosa oposição dos de sua raça, o escárnio dos gentios e a traição dos seus amigos mais chegados. Por isso mesmo, teve grande compaixão; “Cheio de compaixão, Jesus estendeu a mão, tocou nele e disse: Quero. Seja purificado!” (Mc 1.41); “Jesus teve compaixão deles e tocou nos olhos deles. Imediatamente eles recuperaram a visão e o seguiram” (Mt 20.34); “Ao ver as multidões, teve compaixão delas, porque estavam aflitas e desamparadas, como ovelhas sem pastor” (Mt 9.36). Estes e outros testemunhos dos Evangelhos nos fazem saber que a vinda do Filho de Deus a este mundo revela a compaixão que o Pai sente com toda sorte de sofrimentos que o pecado acarreta, seja por sua presença, influência ou por cometimento da parte do homem. Deus não é um Deus distante e indiferente, mas o ‘Emanuel’, está presente em nossa vida, sempre: “O Senhor está perto de todos os que o invocam, de todos os que o invocam com sinceridade” (Sl 145.18); “Deus é o nosso refúgio e a nossa fortaleza, auxílio sempre presente na adversidade” (Sl 46.1). A celebração piedosa do Natal deve comunicar grande segurança aos nossos corações, nunca estamos sozinhos, nunca somos abandonados à nossa própria sorte. Nas comemorações deste ano como ignorar os mais de cento e oitenta mil lares no Brasil dilacerados pela dor da perda de um ente querido, pelo fim de sonhos longamente acalentados e por projetos que jamais sairão da prancheta? Como ignorar os lugares vazios à mesa e muitas vezes também nos corações? Como não pensar nos quase sete milhões de brasileiros já infectados, graças a Deus muitos já curados e outros assintomáticos, mas que por certo passaram e passam dias com os corações sobressaltados pela angústia e pelas incertezas das horas? E o que dizer dos mais de treze milhões de brasileiros desempregados que vêm em cada dia uma eternidade de horas que se passam sem conseguir levar para casa o pão? Como cristãos é nosso imperioso dever nos deixar invadir por esses sentimentos emanados da festa do Natal, compaixão e empatia devem ser parte integrante do nosso seguimento de Jesus, o Deus-humanado. Graças a Deus muito foi feito em favor dos desafortunados dessa hora e ainda, por certo, haverá outra tantas que demandará o nosso compromisso. Entretanto, o que estamos por fazer deve vir precedido de empatia e compaixão. Não basta que apenas façamos a nossa doação pessoal e retornemos para o nosso ensimesmamento. Não é suficiente fazer e participar de campanhas e, depois, retornar ao nosso “Alice no país das maravilhas” e viver alienados em nossos projetos de vida egoístas. Empatia e compaixão são sentimentos que incomodam, desinstalam, nos tiram da nossa zona de conforto. Empatia e compaixão nunca ficam bem retratados em fotos de Facebook e Instagram e não se prestam para fazer propaganda de nossa sociedade, ministério ou mesmo para inflar o nosso ego. Claro, sempre existirá o espaço para compartilhar boas notícias e mecanismos para desafiar a outros ao engajamento. Entretanto, empatia e compaixão ficam melhor em joelhos dobrados diante do Pai, no segredo dos quartos em súplicas incessantes. Ficam bem também em joelhos dobrados aos pés dos nossos semelhantes em atitude de humilde serviço. Empatia e compaixão revelam muito do nosso entendimento do Evangelho quando as nossas relações sociais são mais autênticas e profundas, quando o valor da pessoa está naquilo que ela é e nunca naquilo que possui ou possa oferecer em contrapartida, mas quando o outro é visto com dom. O Natal está às portas; que estejam em nossos corações os mesmos sentimentos de Jesus, quando veio visitar a nossa Terra: Fp 2.5.
Reverendo Luiz Fernando é pastor na Igreja Presbiteriana Central de Itapira
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