A atriz Fernanda Montenegro, na altura dos seus oitenta e três anos, em entrevista recente, respondeu: "A coisa mais dolorosa pela qual tenho passado é ver a minha geração morrer. Nos últimos cinco anos, morreram, além dele (o marido Fernando Torres), Paulo Autran, Raul Cortez, Gianfrancesco Guarnieri, Renato Consorte, Sérgio Viotti, Sérgio Brito, Ítalo Rossi e Millôr Fernandes." E emocionada concluiu: "Você olha em volta e a sua memória está ligada a todo esse mundo que se vai. É muito forte". Imagino que Fernanda Torres continue compartilhando a presença de outros membros da sua geração. Tentei pensar no que sentiria Fernanda - ou qualquer outra pessoa – diante da condição de ser a única vivente do seu tempo?
A reflexão rolava entre os meus pensamentos quando, nesta quarta-feira, à beira do 105º aniversário, Oscar Niemeyer faleceu. É provável que ele fosse o último do seu tempo. Afinal! Isso é bom ou ruim?
Fernanda - assim como era Oscar - é ativa, trabalha e viaja muito. Mal terminou de gravar um filme, já é protagonista de um especial de fim de ano da Rede Globo e se prepara para mais uma peça de teatro que a levará aos palcos brasileiros em 2013.
Niemeyer internado, sempre lúcido, dizia que precisava voltar ao escritório para trabalhar. Um dia antes de morrer pediu um pastel e um cafezinho. Há dois anos, noutra internação, chegou a compor um samba “Tranquilo com a vida” com o enfermeiro que o atendia, dentro do Centro de Terapia Intensiva. Para ele, as visitas aos hospitais só serviam para atrapalhar o trabalho que ele tinha a fazer.
Eis aí alguns indícios para os meus questionamentos. Enquanto Niemeyer destacava o trabalho como a principal fonte da vida, Fernanda se condoía com o desmantelamento da sua turma. Um já tinha perdido as referências do seu tempo, apesar da inteligência e da história construída, apegou-se a si mesmo, no potencial criativo, que era aquilo que ele podia controlar. A outra, apesar do apego ao trabalho, preocupa-se com o bem que não pode dominar: a continuidade da sua geração.
Os dicionaristas definem “uma geração” como espaço de tempo equivalente a vinte e cinco anos que separa cada um dos graus de uma filiação, mas há quem arrisque afirmar que hoje o intervalo que separa uma geração da outra, por força dos avanços tecnológicos, não passa de sete anos. Sociologicamente, os integrantes de uma geração pertencem à mesma faixa etária, viventes do mesmo período histórico e processo social.
Deve estar certa Fernanda Montenegro ao lamentar a partida antecipada da turma do seu tempo. Ela quer manter viva a vida. Niemeyer mostrou que para viver fora da sua geração é preciso ter a própria história a defender, desde que merecedora.
A vida que nos leva à morte, não nos mata de uma vez, mas a cada membro da nossa geração que se vai. Talvez seja por isso a definição de Oscar Niemeyer: a vida é um sopro.
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