Quando o nosso carnaval dividiu espaço com a renúncia do Papa Bento XVI, o nome de Jorge Mario Bergoglio era praticamente desconhecido dos brasileiros e da imprensa mundial. Tanto é que ele nem aparecia nas cabeceiras de nenhuma lista de papáveis, antes do conclave. Mas os cardeais, diante da crise que batia às suas portas, enxergaram um argentino, nascido numa família de imigrantes italianos, jesuíta, como o homem certo para colocar a Santa Sé em ordem. Sabe-se que Bento XVI encomendou um dossiê a três cardeais não eleitores sobre os escândalos que envolveram dinheiro, disputas de poder, condutas inadequadas, vazamento de documentos... Esse estudo ficou pronto antes da eleição e foi entregue ao Papa Francisco assim que assumiu o pontificado. Só um grande líder poderia dar esperanças de resoluções. A dúvida que deve pairar na cabeça dos cardeais talvez seja: “será que acertamos?”
A Igreja Católica, como organismo secular da humanidade, apesar dos quadros constantes de grandes pensadores da nossa civilização, também reflete e sofre com as fraquezas humanas. O mundo passa por crises cíclicas e sistêmicas por conta da natureza do homem que é complexa e se divide em matéria, inteligência, espírito e moralidade. Com os avanços tecnológicos, com as facilitações que propõem vida mais confortável, com mais qualidade e mais duradoura, o apego à materialidade se tornou preferencial. Nasce então a crise cultural, a crise de valores, a doença da infelicidade não admitida. Num momento que temos a certeza de estarmos ligados ao mundo, em frações de segundos, há sentimento de que não temos o controle de nós mesmos, nem do tempo, nem da nossa vontade. Desconfiamos de Deus e todo mundo. Queremos que o outro tome as iniciativas e nos dê as respostas que precisamos. A Igreja Católica peca junto.
O Papa Francisco ao ser anunciado naquela quarta-feira, dia 13 de março, fez parte do globo ver o mesmo que os cardeais: a figura de um líder dotado de grande carisma, que poderia traduzir ao mundo o retorno dos valores humanos.
A participação de Francisco na Jornada Mundial da Juventude, no Rio de Janeiro, tem mostrado que ele é seguro de si e corajoso ao enfrentar uma cidade como o Rio de Janeiro, que além da reconhecida criminalidade, vive momentos de violentas manifestações populares, circulando em carro aberto, no meio do povo. Mostra-se solidário, comprometido com os pobres e com as dificuldades dos jovens. É criterioso com as palavras, sem ser meloso ou oportunista, despertando elogios constantes, quase unânimes, inclusive dos chefes de outras religiões. Conseguiu manter a chama da devoção em meio à chuva e ao frio que há tempos não se via no Brasil, tampouco no Rio de Janeiro.
Está claro, porém, que o Papa ainda não mexeu nas grandes feridas da sua igreja e sem essa partida, talvez o seu carisma e a bondade transparecida não sejam suficientes para influenciar o mundo positivamente. É indubitável que os líderes deste início do século XXI continuam tão importantes para a humanidade como sempre foram, mas a retórica não basta, deve ser substanciosa através de ações concretas. Esperemos que os cardeais e o sentimento popular estejam certos. Não será a Igreja Católica a ganhar com Francisco, mas o mundo.