Brasileiro não tem muito tempo para acompanhar os desdobramentos políticos externos. Nós já temos muito com o que se preocupar do Oiapoque ao Chuí. Não custa, todavia, rememorarmos o que acontecia com a França há menos de dois anos.  Em outubro de 2010, os franceses cruzavam os braços na mais duradora e mais séria greve daquele país. Os jovens se manifestavam, queimavam carros nas ruas. Os arroubos e empáfia de Sarkozy, para responder à crise, entranharam contra as conquistas sociais. Parecia ressuscitar a revolução do século XVIII.

Sarkozy foi o “presidente dos ricos”, brindando-os com regalias fiscais, enquanto sacrificava a classe média com perda de emprego, ampliação da idade para aposentadoria, aumento do custo de vida... Sarkozy perdeu a eleição. Hollande venceu.

Em dois meses de governo, François Hollande suprimiu 100% dos carros oficiais e os encaminhou para leilão. O rendimento foi para a Previdência. Aboliu os carros dos executivos das empresas estatais dizendo que "se um executivo que ganha € 650.000 por ano, não se pode dar ao luxo de comprar um bom carro com o seu rendimento do trabalho, significa que é muito ambicioso, é estúpido ou desonesto. A nação não precisa de nenhuma dessas três figuras". Uma medida que economizou 345 milhões de euros, permitindo a transferência de recursos para criar 175 institutos de pesquisa de alta tecnologia, empregando de 2.560 jovens cientistas, antes desempregados.

Criou uma taxa de emergência que aumentou em 75% os impostos para as famílias que ganham mais de cinco milhões de euros por ano. Com isso foi possível contratar 60 mil diplomados desempregados para atuarem como professores de escolas públicas. Aboliu o conceito de paraíso fiscal, reduzindo a fuga de capital.

Retirou das igrejas subsídios estatais na ordem de 2,3 milhões de euros para construir 4.500 creches e 3.700 escolas primárias.

Reduziu em 25% o salário dos funcionários públicos, em 32% o dos deputados e em 40% dos altos funcionários do governo que ganham mais de € 800.000 por ano. Com os quatro milhões de euros economizados, Hollande passa a cuidar das "mães solteiras" com dificuldades financeiras, garantindo-lhe um salário mensal por cinco anos ou até que a criança chegue à escola primária. Um sério problema social resolvido sem alterar o equilíbrio orçamentário.

Com essas medidas, o novo governo francês recuperou a estabilidade social, o spread com títulos alemães caiu, a inflação que crescia, estancou, a competitividade econômica reagiu, depois de três anos de estagnação e queda. A França parece emergir das cinzas.

Brasileiro, também, costuma não acompanhar, como deveria, o política interna. Mal se envolve nas campanhas eleitorais, prioriza a emoção, a torcida pessoal, desqualifica a razão. A consequência acaba, quase sempre, refletindo na instalação de governos que atrasam o desenvolvimento econômico e social. Uma escolha errada que pode sair muito cara.

Eu até que poderia ter usado no lugar de Sarkozy e Hollande, FHC e Lula. Poderia até contrapor Lula a Dilma, mas se assim o fizesse, muitos antipetistas e antilulistas talvez abandonassem a leitura no meio do caminho. Usei, então, a França, um pais de primeiro mundo, cultura consolidada, chique! Que também comete erros na hora de escolher seus representantes, mas sabe corrigi-los, com protestos e mudanças.

O poder público, eleito diretamente, deve reunir competência, liderança, iniciativa e responsabilidade. Ele pode alavancar a economia, diminuir a desigualdade, tornar o lugar que a gente vive, melhor e mais bonito. Pode encontrar soluções simples para problemas crônicos.

Prestar atenção nos candidatos, para as eleições que se aproximam, é nosso dever, nossa obrigação.