O Fundo das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) nos informa que existe cerca de novecentos milhões de pessoas que passam fome no mundo. Ao lado desse macabro número vem a constatação de que entre a produção e o consumo desperdiçamos, todos os anos, 1,3 bilhão de toneladas de alimentos.
A realidade do trabalho vem sofrendo dramáticas transformações. O mundo está caminhando para eliminar a força bruta realizada pelo homem e reduzir a quantidade de mão de obra empreendida na produção esperada. Enfim, estamos construindo uma sociedade que quer menos trabalhadores, mas quer produzir mais, para vender muito.
Eis uma equação que tem tudo para não dar certo. Milhões de pessoas, não qualificadas que tem, basicamente, o tempo e a força física para vender, estão sendo paulatinamente excluídas do mercado de trabalho. Poderemos dizer, então, que quem não trabalha não deve comer? Ou estaríamos fazendo isso há muito tempo?
Dom Pedro Casaldáliga, bispo de São Félix do Araguaia, diante da fome e do desemprego lançou: “A ética, as ciências sociais, a vontade política, a fé religiosa terão algo a dizer sobre isto? Quem lucra com esta falta de trabalho? Quais as suas causas económicas, políticas, sociais? Que interesses que pecado social mundial se esconde por detrás desta monstruosa fatalidade que atinge uma tão grossa fatia da humanidade, filha do Deus da vida? O trabalho, tal como o pão, é mais que assunto social: é matéria teológica. A sociedade tem de fazer do trabalho e da sua dignidade uma bandeira de luta fundamental, que é preciso defender mesmo à custa de muitas lágrimas e de muito sangue. Séculos de lutas e de legislações do trabalho não podem ser engolidos pelo monstro neoliberal.”
A fala de Dom Pedro nos remete ao final do século XX. Naquela hora ele defendia o envolvimento do mundo cristão nas causas sociais, mas chamava a atenção da sociedade, como um todo, a frear aquela caminhada insana. Não freamos!
Não podemos negar que nos viciamos às novas tecnologias. Aplaudimos a eliminação das funções rotineiras, repetitivas e degradantes, fonte de doenças e de insatisfação. Perfilamo-nos à testa dos lançamentos dos produtos que ocupam cada vez menos braços, mais botões. Estaríamos nós sendo ludibriados pelas facilidades?
O conceito de quem “não trabalha não deve comer” vem da Roma antiga. Naquele tempo, as obras faraônicas requeriam unidades de força em quantidades extraordinárias trocadas por uma ou duas rações diárias.
O trabalho é imprescindível na construção da dignidade humana, no aperfeiçoamento da personalidade, atua na moralidade, fortalece a sociedade, ergue a independência financeira, apura a responsabilidade, gera qualidade e longevidade.
Hoje, a fome não pode mais ser vista como decorrente da malemolência. Os adultos devem ingerir entre 1.400 e 1.700 calorias por dia para cobrir as suas necessidades metabólicas basais. Privar o ser humano das quantidades calóricas mínimas é semelhante à asfixia planejada. Um genocídio patrocinado pelo mundo alimentado e consciente.