A semana passada comportou duas datas emblemáticas: 31 de março e 1º de abril. Nenhuma das duas teve ou chegou ter status de feriado. Uma foi imposta à força, a outra de iniciativa popular. Mas as duas passaram despercebidas por quase todo mundo. Nem sempre foi assim.
No dia 31 de março de 1964, há 51 anos, o Brasil embarcou na mais sangrenta ditadura da sua história apoiada pela população, em nome do combate à corrupção. O golpe culminou no dia seguinte com o fim do governo do presidente democraticamente eleito João Goulart. O Brasil passou por cinco presidentes militares que se sucederam por voto indireto até 1985, quando Tancredo Neves foi eleito, também de forma indireta, como o primeiro presidente civil pós 64.
Alguns gatos pingados se lembraram do aniversário do golpe e se manifestaram. Gente que acredita que o melhor para o Brasil é o retorno dos militares e a mutilação da democracia. Nem todo mundo pensa como eles, felizmente. As pesquisas realizadas pelo IBOPE apontaram que para 46% dos brasileiros a “democracia é preferível a qualquer outra forma de governo”. Apenas 18% disseram que “dá na mesma se um regime é democrático ou não”. Há doze anos, durante o governo FHC, o mesmo IBOPE apresentava número bastante desfavorável à democracia.
Já o dia da mentira começou a ser comemorado na França, no renascimento, após a implantação do calendário gregoriano, em vigor até hoje. Quando o início do ano foi universalizado a partir do dia 1º de janeiro. Nem todo mundo gostou da mudança. Antes, a festa de ano novo começava a ser comemorada no dia 25 de março e terminava apoteoticamente no dia 1º de abril. A maioria seguiu o novo calendário, a minoria conservadora tentou manter a tradição. Na contramão da história, os tradicionalistas começaram a ser satirizados e o dia principal da festa acabou sendo rotulado como o dia da mentira, o dia em que se comemorava o ano que já tinha começado três meses antes. Desde então, pregar mentiras nesse dia virou brincadeira generalizada.
Não faz muito tempo, quase todo mundo se preparava para pregar peças e terminar em gostosas gargalhadas, tanto entre os amigos e familiares, como nos locais de trabalho. A cada ano, a criatividade era ativada. Não é mais assim... O que será que aconteceu?
Existe uma suspeita: a banalização da mentira. Começa nos relacionamentos fortuitos no mundo real ou virtual, passa pelas relações consolidadas, emerge dos meios de comunicação e se consagra na atividade política.
Li, não faz muito tempo, que um teste aplicado entre pessoas desconhecidas conversando foram contadas pelo menos três mentiras por pessoa a cada dez minutos. Descobriu-se em uma experiência que os estudantes mais populares, aqueles com mais amigos, tinham potencial maior para enganar as pessoas com as suas mentiras. Concluiu-se, então, que há uma correlação entre a capacidade de mentir e a competência social, esta que é a principal característica dos políticos.
A gente não precisa mais do primeiro de abril.