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Itapira, 25 de Abril de 2025
Artigo
30/11/2014 | Paolo Colosso: Requalificação Urbana e os espaços de encontros.

  

No mês passado a Prefeitura Municipal realizou o Concurso de projetos para requalificação urbana da Praça Bernardino de Campos, uma iniciativa bastante progressista, que visou trazer profissionais e cidadãos a participarem na elaboração de um projeto de importância fundamental para a cidade. O projeto vencedor mostrou estar atento a questões contemporâneas, como acessibilidade e sustentabilidade, prevendo belas e amplas rampas que dissolvem a divisão por níveis da praça atual. Além disso, contava com uma apresentação impecável tanto em termos visuais quanto explicativos. A fim de contribuir nestas questões, gostaria de chamar a atenção para alguns pontos a meu ver cruciais para reativar um centro com vida urbana intensa e plural.

A meu ver, um projeto com estes objetivos tem de ter como pon­tos de alavancagem não apenas a criação de espaços arquitetônicos agradáveis e bem resolvidos, mas também os usos do espaço. Quero dizer, é preciso mudar os programas que aquele espaço atrai. Praças centrais são, historicamente, lugares com atividades que concentram encontros e sociabilidade. São eles cafés, bares, restaurantes, espaços para expressões artísticas, manifestações de cidadania ativa e religiosas.

Raciocinemos com casos concretos. Na cota alta, a da Igreja, a praça Bernardino de Campos conta com atividades pontuais, com dia e horas especificas; na maior parte do cotidiano atrai poucas atividades. Na cota baixa, da Rua Bernardino de Campos, a praça conta com bons espaços, mas atualmente estes são utilizados por usos administrativos (Departamento de Correção de Condutas ), serviços burocratizados ( Procon), financeiros ( Credita e Banco do Povo). Há uma única exceção, o saudoso Kashiba, que também funciona apenas em horário comercial. Depois das 18h e em fins de semana, tanto a praça existente quanto a versão projetada permanecem de portas fechadas.

Por outro lado , seja em Veneza, Barcelona ou Paris, as praças mais vivas contam sempre com cafés, bares, restaurantes e sorveterias, que não apenas se voltam para a praça como a ocupam, com cadeiras e ombrelones, diuturnamente. A esses exemplos poderíamos objetar que dizem respeito a outro contexto social, com uma cultura mais ar­raigada em termos de vida pública. Vamos então a exemplos próximos: basta irmos a Águas de Lindoia e Serra Negra ( praças centrais), ou a São Paulo ( Rua Augusta, Av. Paulista, Rua Família Mancini e tantas outras da Vila Madalena): as ruas e praças ganham vida com estes comércios onde pessoas sentam para conversar, encontrar amigos, comer e beber algo, sociabilizarem-se, cedo, à tarde e à noite. São turistas, pais com seus filhos, executivos, jovens com seus “ficantes”, artistas de rua etc. Podemos olhar para a própria cidade de Itapira e perceber como os cafés e bares com mesas na calçada estão sempre cheios. E as mesas na calçada sempre as mais procuradas. Basta perceber o quanto o calçadão da José Bonifácio trouxe de atividade para os comércios que sabem usar deste espaço – vale destaque para o Jazz Café.

E não estou sozinho com estes argumentos. Em Morte e Vida das Grandes Cidades, uma das obras mais renomadas do urbanismo do fim do século XX, Jane Jacobs defendeu a importância de uma cidade ter atividades diversas, com usos combinados, que tragam pessoas em horários distintos ( vale conferir a edição brasileira da ed. Martins Fontes, sobretudo entre as págs. 165 a 195). Em Cidade Para Pessoas, o urbanista Jan Gehl, especialista em projetos urbanos – com trabalhos em Copenhage, Melbourne e Londres –, salienta que o centro urbano deve ser pensado não tanto para automóveis, mas para os usuários. Entre as atividades que trazem vida urbana, Gehl confere destaque aos cafés:

“De todas as atividades de permanência que se apresentam sobre uma zona urbana, os cafés que se abrem para uma calçada desem­penham um papel importante na conformação da paisagem urbana contemporânea(...)O atrativo real e a justificação dos cafés é a de que permite entrar em contato com a vida que ocorre na calçada, o espaço público. A possiblidade de descansar e beber algo é somente um atrativo a mais. Tomar um café é a razão pela qual alguém se senta sobre uma calçada, mas é também um motivo para observar o desenrolar da vida urbana”. (pp.145-146)

A contribuição dos autores está, a meu ver, em mostrar que a vida urbana pode florescer por meio de instrumentos bastante simples e atividades bastante conhecidas: aquelas que concentram encontros. Como projetar é uma atividade essencialmente especulativa, referências teóricas e casos historicamente exitosos nos ajudam a raciocinar com mais concretude.

Paolo Colosso é arquiteto, tem graduação em Filosofia pela Unicamp. Atualmente faz mestrado no departamento de Filosofia da USP, onde estuda cultura urbana em metrópoles contemporâneas.

Fonte: Paolo Colosso

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