Aquele domingo deve ter ficado por muito tempo na mente do povo e as cenas daquele dia devem ter sido o centro das conversas das pessoas por um bom tempo. Aquele dia em que Jesus Cristo encenou diante de todos as promessas bíblicas do Antigo Testamento, da entrada triunfal do Rei-Messias, o Filho de Davi, aquele que traria a glória definitiva para Israel. Contudo, é bem possível também que uma ponta de incredulidade e mesmo de decepção tenha em algum momento assaltado aqueles corações, passada a euforia do momento. Afinal de contas, Jesus não era um ilustre desconhecido daquela multidão, era um Mestre cuja fama circulava em Jerusalém, seus discursos, seus confrontos com a liderança religiosa e política da Cidade Santa, seus milagres haviam arrebatado os corações de muitos e também provocado o ciúme, a desconfiança e ódio de outros tantos. Talvez, no imaginário religioso coletivo do povo, não obstante a profecia do Antigo Testamento: “Alegre-se muito, cidade de Sião! Exulte, Jerusalém! Eis que o seu rei vem a você, justo e vitorioso, humilde e montado num jumento, um jumentinho, cria de jumenta” (Zc 9.9), aquela cena parecia pobre e simples demais. O filho do carpinteiro, pobremente vestido e, quem sabe, suado e empoeirado da peregrinação, entra na capital da nação e é aclamado rei por uma multidão em êxtase, com palmas, ramos e vestes estendidas pelo caminho. Podemos pensar que depois da passagem do cortejo e com o correr das horas e dos dias, alguma coisa foi mudando na percepção daquele povo. Já na sexta-feira, uma multidão parecida com essa se depara com outra cena igualmente impactante, o seu proclamado Rei-Messias agora coroado de espinhos, com a púrpura do seu sangue a servi-lhe de ornamento real. Essa multidão pede a libertação de um assassino em troca da pena capital para o seu Rei. As pessoas, mesmo as mais religiosas, continuam tendo uma percepção distorcida da pessoa e da missão de Jesus Cristo. Com raras exceções (embora certos segmentos organizados comecem a demostrar violenta antipatia cada vez mais acentuada), Jesus recebe a admiração e algum tipo de afeto por parte dos homens. Sua sabedoria é altamente considerada, sua retidão moral reconhecida, sua justiça e ética desejáveis e suas obras celebradas. Todavia, os homens o desejam como naquele dia em Jerusalém, vendo-o passar, saudando-o pelo caminho, tendo uma aproximação segura de sua influência, reconhecendo a sua realeza, mas não se submetendo à sua autoridade. É possível que em certa medida isso aconteça também com muitos membros da igreja ainda hoje. Sentem-se atraídos pela beleza do Evangelho, se emocionam com o louvor e encontram certo prazer e conforto nas Escrituras. Mas, assim como aqueles daquela multidão, com o correr das horas e dos dias, alguma coisa muda em sua percepção sobre a identidade da pessoa de Jesus e seu relacionamento com Ele. A admiração desaparece como neblina, a atração fica diminuída e o Senhorio de Cristo se torna irrelevante, desimportante e sua autoridade já não é mais reconhecida ou obedecida. Para que essa percepção alterada não nos leve a fazer escolhas erradas na vida, precisamos vencer os dias de Ramos renovando a nossa fé, o nosso amor, a nossa obediência e a nossa submissão a Cristo. Precisamos, com o auxílio da graça, a iluminação do Espírito Santo e as instruções das Escrituras nos submeter voluntária e amorosamente ao governo amplo, profundo e irrestrito de Jesus Cristo em nossas vidas, conforme Kuyper: “Não existe nenhuma área de todo o domínio da existência humana sobre a qual Cristo, que é soberano sobre tudo, não diga: Isto é meu”. A festa de Ramos quer ajudar-nos na rendição do governo de nossa própria vida e entregar tudo ao controle soberano e absoluto de Jesus para que Ele reine sobre nós.
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