Uma tradição que remonta seguramente desde os primórdios da colonização portuguesa no Brasil ainda resiste à modernidade, aquela onde crianças saem às ruas batendo de porta em porta dizendo a seu interlocutor “bons princípios de ano” na esperança de ganhar algum dinheiro. Segundo pesquisa feita por A Cidade, este costume tem origem nos chamados países ‘ibéricos”, Portugal, Espanha e Itália.
Fato é que mesmo aquelas pessoas mais antigas se lembram que quando crianças a tradição já existia, embora restrita aos meninos. Com o passar dos anos também as meninas passaram a andar em grupos ou sozinhas pedindo. A estudante Luciene Aparecida Lopes Silva, de 11 anos, da Escola Estadual Benedito Flores de Azevedo caminhava ao lado do amigo Tiago Silverio Magi, de 11 anos e também matriculado na mesma escola.
Ela contou que muitas pessoas disseram que não davam “bom ano para meninas”. Ainda sim o resultado da empreitada dava a ela uma certa vantagem com relação colega pelo menos no número de balas. “Dinheiro quase ninguém dá, preferem dar balas”, corroborou o amigo. Não quiseram revelar o quanto haviam recebido, mas garantiram “que não era muito”.
Nas imediações do Jardim Nova Itapira, Naomi Cristina Figueiredo, 12 anos disse que decidiu se aventurar a partir do ano passado depois que viu o irmão menor, Marcelo , de 07 anos, voltar com os bolsos cheios de moedas. “Imaginei que seria mais fácil”, contou ela, resignada, de posse de algumas guloseimas e uns poucos reais. Mais guloseimas foi o que ela ganhou da dona de casa Maria da Penha Trani, moradora da rua José do Patrocínio. “Dinheiro eu não dou. Gosto de dar algo gostoso para as crianças comerem” contou ela. Segundo a moradora, Naomi era a primeira criança que batia em sua casa no primeiro dia do ano. “Até estranhei, porque normalmente muitas delas fazem isso”, relatou.
Na região central, a cerimônia de posse dos novos vereadores, do prefeito e vice-prefeito chamou a atenção de um grupo de meninas e um único menino todos oriundos da Vila Ilze, que estavam pedindo bom ano. Algumas esfregaram as mãos ao ver a pequena multidão imaginando que talvez pudessem ter tirado a sorte grande. Depois de colocadas a par do que acontecia ali pela reportagem de A Cidade, arrefeceram o ímpeto e decidiram bater em outras paragens.
Paloma Ribeiro, de 14 anos era a mais velha. Sua irmã Maisa de 10, a mais nova. Tinha também Laila Aparecida Lourenço, de 11, mesma idade de Daniele (que não disse o sobrenome) e o pequeno Richard Dias, de 04 anos. Elas contaram que estavam desde cedo andando pelas ruas “pedindo bons princípios de ano”, mas o resultado pelo menos até então as desapontava. “O pessoal só da balas”, reclamou Maisa. Paloma contou que há pelo menos quatro anos que sai às ruas no primeiro dia do ano e que suspeitava o grupo numeroso talvez espantasse eventuais doadores. “Quando é para dar (donativo) para um só acho que fica mais fácil”, contemporizou.
Felizes
Já era quase meio dia quando, Luiz Eduardo Mistertainer, 12 anos e Vitor Assis Soares, 11, batiam em residências localizadas na Vila Bazani. Moradores nas imediações, contaram que saíram cedinho para tentar a sorte. E pelo relato de ambos, a colheita foi farta. Luiz Eduardo contabilizava cerca de R$ 70,00, enquanto que o colega garantiu que já tinha pouco mais de R$ 100,00. O primeiro disse ainda que já dava como certo outros R$ 50,00 prometidos pela avó. Felizes da vida, já nem se importavam com um ‘não’ descarado dado por um grupo de moradores onde Luiz Eduardo tinha acabado de bater. “A maioria não dá nada, nem cumprimento. Mas sempre tem aquelas pessoas mais generosas e no final valeu a pena”, avaliou.
Grupo de crianças que saiu da Vila Ilze para a região central: muitas balas
Luciene com o colega Tiago vasculharam a região do Penhão
Luiz Eduardo e Vitinho: bolsos cheios