A Câmara Municipal de Itapira protagonizou na última segunda-feira, numa sessão extraordinária que começou de manhã e só foi encerrada noite adentro, um fato inédito nos anais da atividade política local ao cassar o mandato do vice-prefeito Antonio Eduardo Boretti, o Dado (PCdo B). Foi o desfecho resultante de uma Comissão Processante instalada em 26 de agosto do ano passado com o objetivo de apurar supostas irregularidades que teriam sido cometidas pelo então vice-prefeito, quando ocupava a presidência do SAAE (Serviço Autônomo de Águas e Esgotos), função que exerceu em duas oportunidades, de março de 2010 a março de 2012, e mais recentemente no início da gestão do prefeito José Natalino Paganini (PSDB), permanecendo até junho do ano passado, quando surgiu o ‘Caso dos Cheques’.
Votaram pela cassação os sete vereadores que dão sustentação ao prefeito, incluindo o atual presidente da Câmara, o vereador Décio da Rocha Carvalho (PSB), acompanhado por Juliano Feliciano (PRB), Pedro Stringuetti (PPS), Maurício Casimiro de Lima (PSDB), Luiz Machado (PTC), Carlos Alberto Sartori (PSDB)e Joilson Batista Militão da Silva (PSDB). Votaram contra a cassação os vereadores Rafael Donisete Lopes (PROS), Marcos Paulo da Silva (PRB) e Cesar Augusto da Silva (PT).
A decisão histórica do Legislativo repercutiu regionalmente. Na sua edição de quarta-feira, o jornal Correio Popular, de Campinas, deu destaque ao assunto. Na cidade, o assombro pela decisão da Câmara foi particularmente repercutido nos meios políticos. Algumas lideranças políticas ouvidas preferiram não se manifestar sobre o assunto. Foi o caso do ex-vereador e ex-presidente da Câmara, Manoel de Alvário Marques Filho e do também ex-presidente do Legislativo e ex-vice-prefeito, Antonio Orcini.
O advogado Antonio Carlos Martins, 75, que foi vereardor e vice-prefeito em dois mandatos sucessivos ( 2005 a 2012), disse que não estava apto a emitir comentários sobre a decisão da Câmara porque, segundo ele, não teve acesso a informações do processo, que correu de forma sigilosa. “Fazer uma análise mais criteriosa sobre se a decisão foi correta ou não, fica impraticável porque a gente não tem os elementos que foram à discussão”, ponderou. Lembrou ainda que quando vereador no começo dos anos 70, houve uma iniciativa parecida deflagrada por uma moção realizada pelo vice-prefeito Aparecido Riberti, que acusou o então prefeito Alcides de Oliveira de irregularidades e propôs uma ação para cassação de seu mandato. “A Câmara simplesmente arquivou o pedido por falta de fundamentação”, relembrou.
Contudo, fez questão de ressaltar que o fato não traz, em sua opinião, nada de positivo para o contexto político local. “Nossa expectativa é sempre no sentido de que haja um clima de cordialidade no relacionamento da classe política, uma convergência de propósitos que leve em conta as necessidades da nossa população”, discorreu. Martins foi o caso típico de um vice-prefeito que atuou de forma harmônica com o titular do cargo, no caso o ex-prefeito Antonio Hélio Nicolai, o Toninho Bellini. Segundo seus cálculos, nos oito anos em que foi vice, acabou se sentando na cadeira de prefeito por quase 200 dias. “O bom vice é aquele que atua de forma discreta, sem ficar interferindo nas decisões do titular do cargo”, ensina.
Toninho Bellini, por sua vez, disse que na sua opinião a Câmara poderia, se assim entendesse a maioria, caso chegasse a conclusão de que o vice-prefeito cometeu algum delito, deixar o caso a critério do Ministério Público. “A mim transpareceu que foi tomada uma decisão política. O caminho natural para a apuração de algum tipo de ilícito administrativo seria o Ministério Público”, opinou. Bellini foi testemunha de defesa no caso. “Quando solicitado, afirmei que desconhecia qualquer tipo de ilicitude nos atos do Dado enquanto presidente do SAAE em minha gestão”, revelou.
Precedente
A ex-vereadora Sônia Calidone dos Santos lembra que em 2003, no primeiro dos três mandatos que exerceu, foi alvo de uma Comissão Processante solicitada pelo então vereador Dirceu de Oliveira, que a acusou de quebra de decoro por se sentir ameaçado por um pronunciamento da vereadora a respeito de um controverso assunto envolvendo cessão de terrenos públicos para a iniciativa privada. “Enfrentei a CP e provei que a acusação não teve o menor embasamento e o caso acabou sendo arquivado”, relembrou. Sobre o caso atual, afirmou sem pestanejar que no seu entendimento o caso foi um jogo de cartas marcadas. Como advogada, ela considera que a defesa de
Dado Boretti irá reverter a cassação na Justiça Comum, mas acrescentou que um processo destes demandará de seis a oito anos e que durante todo este tempo o reclamante ficará com a pecha de ter praticado atos de improbidade administrativa.
O presidente do diretório municipal do PCdoB (Partido Comunista do Brasil), Syllas Marcos Silveira, 45, pretende levar o casopara análise do diretório regional. Disse que fica numa situação difícil por ser amigo tanto de Dado Boretti, quanto de Paganini. “Fico entre a cruz e a espada”, justificou. Ele disse que conversou com Dado Boretti após consumada sua cassação e que este estava acometido de um sentimento de enorme indignação e revolta. “Ele argumentou que sua defesa estava muito bem elaborada e que os vereadores simplesmente ignoraram os principais pontos apresentados, deixando patente, segundo seu entendimento, que a sentença já estava pronta”.
Comentários, artigos e outras opiniões de colaboradores e articulistas não refletem necessariamente o pensamento do site, sendo de única e total responsabilidade de seus autores.