A igreja cristã evangélica brasileira experimentou um grande crescimento nas últimas décadas. Chegamos, segundo dados do IBGE, a 42 milhões de evangélicos, em um universo de pouco mais de 200 milhões de habitantes. Não deixa de ser um número significativo que traduz muita coisa, que eleva o nosso coração agradecido a Deus, mas que também nos faz corar de vergonha. O crescimento evangélico parece não ter provocado transformações significativas e impactantes na sociedade como um todo, diferentemente como ocorreu na Coreia do Sul, por exemplo. O estado brasileiro que possui a maior concentração de evangélicos é o Rio de Janeiro, estranhamente uma das sociedades que passa pelas maiores crises éticas na política e na governança. Um grande desafio para o anúncio das Boas Novas e o testemunho dos discípulos. Mas, até aqui, com raríssimas exceções, porém não sem heroísmo, a presença de um grande número de igrejas e ministérios parece não ter produzido no Brasil as transformações desejadas e esperadas. Isto leva-nos a uma profunda reflexão quanto a nossa incapacidade de projetar nas estruturas do mundo a força transformadora e ressignificadora da realidade que é o Evangelho do Reino de Deus. Nossa grande falha pode estar em nossa cristologia, em nossa compreensão mais acurada da pessoa de Cristo, suas obras, seus ensinamentos, suas ordenanças deixadas à igreja, a expectativa que Ele tem sobre o seu povo e a perspectiva que Ele tem de nós nesse exato momento da história. Parece estranha a minha posição, mas tenho tido a impressão de que em muitos contextos eclesiásticos Jesus Cristo ou é um ilustríssimo desconhecido ou é uma caricatura dele que vem sendo apresentada diante os homens. Quando Ele não é reduzido a um mero realizador de desejos e caprichos humanos, uma espécie de guru para a felicidade e um servo que deve atender às vontades mais egoístas e idólatras, Ele tem sido reduzido a um modelo revolucionário. O mais estranho é que forças ideológicas antagônicas recorrerem a Jesus Cristo no desejo de obterem credibilidade e legitimidade para as suas reivindicações. Precisamos voltar às grandes afirmações do Novo testamento a respeito de Jesus Cristo para centrar nele a totalidade de nossa vida, ética, missão e adoração. Pois, como a Escritura mesmo declara: “Nele estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento” (Cl 2.3), somente nele é que possuímos a perspectiva correta de quem somos, em quem devemos nos tornar e em que coisas Ele deseja que engajemos a nossa vida. A primeira coisa que a Igreja precisa, por mais patética que pareça essa afirmação, é voltar a crer e a pregar a divindade de Cristo. Cristo é Deus, é a segunda pessoa da Trindade Bendita. Isso significa que Ele está tanto acima, como para além da criação, tanto quanto Ele é o Senhor e proprietário de todas as coisas criadas, quer nos céus, quer na terra: “Ele é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação, pois nele foram criadas todas as coisas nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos ou soberanias, poderes ou autoridades; todas as coisas foram criadas por ele e para ele. Ele é antes de todas as coisas, e nele tudo subsiste” (Cl 1.15-17). Logo, como Senhor absoluto e soberano que é, não pode ser tratado como um serviçal sempre disponível às nossas veleidades, não pode ser usado, ‘manipulado’ ideologicamente para sustentar posições e interesses reducionistas comparando-o a um “Che Guevara” espiritual, menos ainda servir-se de sua retidão e de seu altíssimo padrão moral para reivindicar posições conservadoras ou de ‘direita’. Jesus Cristo transcende, ressignifica, coloca em correta perspectiva e não se identifica plenamente com nenhum desses projetos humanos. A Igreja precisa recordar-se, e sempre, de que Ele (Jesus) é a sua maior autoridade. Não os Concílios e menos ainda as reivindicações de infalibilidade e de unção especial dos líderes ou a força ‘democrática’ de algum sistema de autogoverno eclesiástico: “Deus colocou todas as coisas debaixo de seus pés e o designou como cabeça de todas as coisas para a igreja” (Ef 1.22). Jesus exerce o seu governo sobre a igreja pela genuína pregação das Escrituras. Seu trono é o púlpito. Quando as Escrituras são investigadas com acurácia, lidas com inteligência e piedade, pregadas com sinceridade e intenção de glorificar a Deus na salvação de pecadores e edificação dos Santos. Quando as Escrituras se tornam, por meio da iluminação e condução do Espírito Santo, uma autoridade para toda a extensão da vida, não restam dúvidas de que Cristo conduz a Igreja em triunfo. Sem o conhecimento das excelências de Cristo e uma vida inteira centrada nele, nossas igrejas têm muito pouco ou mesmo nada a oferecer ao mundo.
Reverendo Luiz Fernando dos Santos é Ministro da Palavra na Igreja Presbiteriana Central de Itapira.
Comentários, artigos e outras opiniões de colaboradores e articulistas não refletem necessariamente o pensamento do site, sendo de única e total responsabilidade de seus autores.