Em épocas de mudança de administração pública, os ânimos se agitam. Há os cidadãos que se animam com esperança de que tempos melhores virão, há os que se amedrontam simplesmente com o fato das mudanças. Há o grupo de servidores que se animam pela expectativa de ter bons cargos, há os que receiam com o risco de perder os seus. Essas agitações me lembram um pouco os ânimos e especulações do mercado de ações. Mas para além das animosidades dos anseios e receios, é importante lembrar algumas aspectos fundamentais da administração pública, que o distinguem do mercado.
Primeiro: os dirigentes, servidores e todos os cidadãos em geral, não somente nesse momento de transformações, tem de ter como ideal regulador que o aparelho do Estado não se confunde com os grupos que administram a dita máquina pública, em outros termos, a administração pública não trabalha para um grupo político ou para outro, assim como não trabalha para um grupo ou classe de cidadãos em detrimento de outros. Sabidamente, num funcionamento real essa separação ou neutralidade da administração é bastante complexa, mas ela existe, foi um ganho histórico do republicanismo. E, como eu disse, esse ideal regulador da neutralidade é o que nos permite entender que o Estado é uma instituição mais sólida do que grandes corporações que flutuam no atual mercado neoliberal, cujos objetivos são, antes de tudo, crescer indefinidamente, animando fetiches e contendo ressacas.
Segundo: os compromissos e responsabilidades dos dirigentes e servidores não são com donos da empresa, porque o Estado não tem proprietários. O compromisso dos servidores são com os serviços públicos, os bens públicos, a coletividade de cidadãos, enfim, com o Estado.
Por fim, gostaria de ressaltar outro ponto importante. Gostaria que esse texto não fosse lido de maneiras enviesadas – como parece ocorrer com certa frequência em textos sobre política. Meu objeto nesse texto não são as querelas políticas municipais. Meu objetivo é elucidar, através dessas comparações, que quem vive nas expectativas e especulações, euforia e ressaca são os ânimos do mercado neoliberal, que tendem também às longas crises. E sobretudo salientar que o Estado, por sua vez, poderia sim ser mais racional.
Paolo Colosso é arquiteto e formado em Filosofia pela Unicamp. Atualmente faz mestrado em Filosofia na USP. Contato: [email protected]
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